Contexto Histórico
Após o Concílio de Trento,
realizado entre os anos de 1545 e 1563 e que teve como consequência uma
grande reformulação do Catolicismo, em resposta à Reforma protestante, a
disciplina e a autoridade da Igreja de Roma foram restauradas,
estabelecendo-se a divisão da cristandade entre protestantes e
católicos.
Nos Estados protestantes, onde as
condições sociais foram mais favoráveis à liberdade de pensamento, o
racionalismo e a curiosidade científica do Renascimento continuaram a se
desenvolver. Já nos Estados católicos, sobretudo na Península Ibérica,
desenvolveu-se o movimento chamado Contrarreforma, que procurou reprimir
todas as tentativas de manifestações culturais ou religiosas contrárias
às determinações da Igreja Católica. Nesse período, a Companhia de
Jesus passa a dominar quase que inteiramente o ensino, exercendo papel
importantíssimo na difusão do pensamento aprovado pelo Concílio de
Trento.
O clima geral era de austeridade e
repressão. O Tribunal da Inquisição, que se estabelecera em Portugal
para julgar casos de heresia, ameaçava cada vez mais a liberdade de
pensamento. O complexo contexto sociocultural fez com que o homem
tentasse conciliar a glória e os valores humanos despertados pelo
Renascimento com as ideias de submissão e pequenez perante Deus e a
Igreja. Ao antropocentrismo renascentista (valorização do homem) opôs-se
o teocentrismo (Deus como centro de tudo), inspirado nas tradições
medievais.
Essa situação contraditória
resultou em um movimento artístico que expressava também atitudes
contraditórias do artista em face do mundo, da vida, dos sentimentos e
de si mesmo; esse movimento recebeu o nome de Barroco. O
homem se vê colocado entre o céu e a terra, consciente de sua grandeza
mas atormentado pela ideia de pecado e, nesse dilema, busca a salvação
de forma angustiada. Os sentimentos se exaltam, as paixões não são mais
controladas pela razão, e o desejo de exprimir esses estados de alma vai
se realizar por meio de antíteses, paradoxos e interrogações. Essa
oscilação que leva o homem do céu ao inferno, que mostra sua dimensão
carnal e espiritual, é uma das principais características da literatura
barroca. Os escritores barrocos abusam do jogo de palavras (cultismo) e do jogo de ideias ou conceitos (conceptismo).
Temas frequentes na Literatura Barroca
- fugacidade da vida e instabilidade das coisas;
- morte, expressão máxima da efemeridade das coisas;
- concepção do tempo como agente da morte e da dissolução das coisas;
- castigo, como decorrência do pecado;
- arrependimento;
- narração de cenas trágicas;
- erotismo;
- misticismo;
- apelo à religião.
Arte Barroca
A arte barroca procurou captar a
realidade em pleno movimento. Mais do que estrutura, porém, o que se
buscava era o embelezamento de portas e janelas e da ornamentação de
interiores. As colunas, altares e púlpitos eram recobertos com espirais,
flores e anjos – revestidos de ouro –, numa integração da pintura,
escultura e arquitetura, exercendo sobre o espectador uma grande atração
visual. No Brasil, a exploração do ouro e de pedras preciosas na região
de Minas Gerais impulsionou a produção da arte barroca.
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Basílica de Nossa Senhora do Carmo em Recife (PE), uma das glórias do barroco brasileiro.
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Última Ceia (1795-1796), do escultor Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho
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Basílica do Bom Jesus de Matosinhos, em Contagem (MG)
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Afresco da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto (MG), por Manuel da Costa Athayde
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Características do Barroco
O estilo barroco nasceu em
decorrência da crise do Renascimento, ocasionada, principalmente, pelas
fortes divergências religiosas e imposições do catolicismo e pelas
dificuldades econômicas decorrentes do declínio do comércio com o
Oriente.
Todo o rebuscamento presente na arte e
literatura barroca é reflexo dos conflitos dualistas entre o terreno e o
celestial, o homem (antropocentrismo) e Deus (teocentrismo), o pecado e
o perdão, a religiosidade medieval e o paganismo presente no período
renascentista.
1) A arte da contrarreforma
A ideologia do Barroco é fornecida pela
Contrarreforma. Em nenhuma outra época se produziu tamanha quantidade
de igrejas, capelas, estátuas de santos e monumentos sepulcrais. As
obras de arte deviam falar aos fiéis com a maior eficácia possível, mas
em momento algum descer até eles. A arte barroca tinha que convencer,
conquistar e impor admiração.
2) Conflito entre corpo e alma
O Renascimento definiu-se pela
valorização do profano, pondo em voga o gosto pelas satisfações
mundanas. Os intelectuais barrocos, no entanto, não alcançam
tranquilidade agindo de acordo com essa filosofia. A influência da
Contrarreforma fez com que houvesse oposição entre os ideais de vida
eterna em contraposição com a vida terrena e do espírito em
contraposição à carne. Na visão barroca, não há possibilidade de
conciliar essas antíteses: ou se vive a vida sensualmente, ou se foge
dos gozos humanos e se alcança a eternidade. A
tensão de elementos contrários causa no artista uma profunda angústia:
após arrojar-se nos prazeres mais radicais, ele se sente culpado e busca
o perdão divino. Assim, ora ajoelha-se diante de Deus, ora celebra as
delícias da vida.
3) O tema da passagem do tempo
O homem barroco assume
consciência integral no que se refere à fugacidade da vida humana
(efemeridade): o tempo, veloz e avassalador, tudo destrói em sua
passagem. Por outro lado, diante das coisas transitórias
(instabilidade), surge a contradição: vivê-las, antes que terminem, ou
renunciar ao passageiro e entregar-se à eternidade?
4) Forma tumultuosa
O estilo barroco apresenta forma
conturbada, decorrente da tensão causada pela oposição entre os
princípios renascentistas e a ética cristã. Daí a frequente utilização
de antíteses, paradoxos e inversões, estabelecendo uma forma
contraditória, dilemática. Além disso, a utilização de interrogações
revela as incertezas do homem barroco frente ao seu período e a inversão
de frases a sua tentativa na conciliação dos elementos opostos.
5) Cultismo e conceptismo
O cultismo
caracteriza-se pelo uso de linguagem rebuscada, culta, extravagante,
repleta de jogos de palavras e do emprego abusivo de figuras de estilo,
como a metáfora e a hipérbole. Veja um exemplo de poesia cultista:
Ao braço do Menino Jesus de Nossa Senhora das Maravilhas, A quem infiéis despedaçaram
O todo sem a parte não é todo;
A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo o todo. (Gregório de Matos)
A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga que é parte, sendo o todo. (Gregório de Matos)
Já o conceptismo, que
ocorre principalmente na prosa, é marcado pelo jogo de ideias, de
conceitos, seguindo um raciocínio lógico, nacionalista, que utiliza uma
retórica aprimorada. A organização da frase obedece a uma ordem
rigorosa, com o intuito de convencer e ensinar. Veja um exemplo de prosa
conceptista:
Para um homem se ver a si mesmo são
necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego,
não se pode ver por falta de olhos; se tem espelhos e olhos, e é de
noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister¹ luz, há mister
espelho e há mister olhos. (Pe. Antônio Vieira)
¹mister: necessidade de, precisão.
Figuras de Linguagem no Barroco
As figuras de estilo mais comuns
nos textos barrocos reforçam a tentativa de apreender a realidade por
meio dos sentidos. Observe:
Metáfora: é uma comparação implícita. Tem-se como exemplo o trecho a seguir, escrito por Gregório de Matos:
Se és fogo, como passas brandamente?
Se és neve, como queimas com porfia?
Se és neve, como queimas com porfia?
Antítese: reflete
a contradição do homem barroco, seu dualismo. Revela o contraste que o
escritor vê em quase tudo. Observe a seguir o trecho de Manuel Botelho
de Oliveira, no qual é descrita uma ilha, salientando-se seus elementos
contrastantes:
Vista por fora é pouco apetecida
Porque aos olhos por feia é parecida;
Porém, dentro habitada
É muito bela, muito desejada,
É como a concha tosca e deslustrosa,
Que dentro cria a pérola formosa.
Porque aos olhos por feia é parecida;
Porém, dentro habitada
É muito bela, muito desejada,
É como a concha tosca e deslustrosa,
Que dentro cria a pérola formosa.
Paradoxo: corresponde
à união de duas ideias contrárias num só pensamento. Opõe-se ao
racionalismo da arte renascentista. Veja a estrofe a seguir, de Gregório
de Matos:
Ardor em firme Coração nascido;
pranto por belos olhos derramado;
incêndio em mares de água disfarçado;
rio de neve em fogo convertido.
pranto por belos olhos derramado;
incêndio em mares de água disfarçado;
rio de neve em fogo convertido.
Hipérbole: traduz ideia de grandiosidade, pompa. Veja mais um exemplo de Gregório de Matos:
É a vaidade, Fábio, nesta vida,
Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.
Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.
Prosopopeia: personificação de seres inanimados para dinamizar a realidade. Observe um trecho escrito pelo Padre Antonio Vieira:
No diamante agradou-me o forte, no cedro o incorruptível, na águia o sublime, no Leão o generoso, no Sol o excesso de Luz.
Barroco no Brasill
O Barroco foi introduzido no
Brasil por intermédio dos jesuítas. Inicialmente, no final do século
XVI, tratava-se de um movimento apenas destinado à catequização. A
partir do século XVII, o Barroco passa a se expandir para os centros de
produção açucareira, especialmente na Bahia, por meio das igrejas.
Assim, a função da igreja era ensinar o caminho da religiosidade e da
moral a uma população que vivia desregradamente.
Nos séculos XVII e XVIII não
havia ainda condições para a formação de uma consciência literária
brasileira. A vida social no país era organizada em função de pequenos
núcleos econômicos, não existindo efetivamente um público leitor para as
obras literárias, o que só viria a ocorrer no século XIX. Por esse
motivo, fala-se apenas em autores brasileiros com
características barrocas, influenciados por fontes estrangeiras
(portuguesa e espanhola), mas que não chegaram a constituir um movimento
propriamente dito. Nesse contexto, merecem destaque a poesia de Gregório de Matos Guerra e a prosa do padre Antônio Vieira representada pelos seus sermões.
Didaticamente, o Barroco brasileiro tem seu marco inicial em 1601, com a publicação do poema épico Prosopopeia, de Bento Teixeira.
Conheça a seguir os trechos selecionados:
Prosopopeia
I
Cantem Poetas o Poder Romano, Sobmetendo Nações ao jugo duro; O Mantuano pinte o Rei Troiano, Descendo à confusão do Reino escuro; Que eu canto um Albuquerque soberano, Da Fé, da cara Pátria firme muro, Cujo valor e ser, que o Ceo lhe inspira, Pode estancar a Lácia e Grega lira. II As Délficas irmãs chamar não quero, que tal invocação é vão estudo; Aquele chamo só, de quem espero A vida que se espera em fim de tudo. Ele fará meu Verso tão sincero, Quanto fora sem ele tosco e rudo, Que per rezão negar não deve o menos Quem deu o mais a míseros terrenos. |
Esse poema, além de traçar
elogios aos primeiros donatários da capitania de Pernambuco, narra o
naufrágio sofrido por um deles, o donatário Jorge Albuquerque Coelho.
Apesar de os críticos o considerarem de pouco valor literário, o texto
tem seu valor histórico pois foi a primeira obra do Barroco brasileiro e
o marco inicial do primeiro estilo de época a surgir no Brasil.
fonte: soliteratura.com.br
a) Quais são os dois modos contrastantes de ver a mulher, em sua lírica amorosa?
b) Como aparece em sua lírica religiosa a idéia de Deus e do pecado?
fonte: soliteratura.com.br
Barroco em Portugal:
Barroco no Brasil:
Exercícios:
1 - (Fuvest) A respeito do Padre Antônio Vieira, pode-se afirmar que:
a) Embora vivesse no Brasil, por sua formação lusitana, não se ocupou de problemas locais
a) Embora vivesse no Brasil, por sua formação lusitana, não se ocupou de problemas locais
Procurava adequar os textos bíblicos às realidades de que tratava.
Dada sua espiritualidade, demonstrava desinteresse por assuntos mundanos.
Em função de seu zelo para com Deus, utilizava-o para justificar todos os acontecimentos políticos e sociais.
e) Mostrou-se tímido diante dos interesses dos poderosos.
2 - (Fuvest) Os sonetos de Bocage que transpõem poeticamente a experiência do autor na região colonial de Goa apresentam alguns traços semelhantes aos dos poemas em que, anteriormente, Gregório de Matos enfocara a sociedade colonial da Bahia. Sob esse aspecto, são traços comuns a ambos os poetas:
a) presunção de superioridade, crítica da vaidade, preconceito de cor.
b) sensualismo, crítica da presunção, elogio da mestiçagem.
c) presunção de superioridade, elogio da nobreza local, sátira da mestiçagem.
d) sensualismo, crítica da nobreza antiga, preconceito de cor.
e) estilo tropical, crítica da vaidade, elogio da mestiçagem.
2 - (Fuvest) Os sonetos de Bocage que transpõem poeticamente a experiência do autor na região colonial de Goa apresentam alguns traços semelhantes aos dos poemas em que, anteriormente, Gregório de Matos enfocara a sociedade colonial da Bahia. Sob esse aspecto, são traços comuns a ambos os poetas:
a) presunção de superioridade, crítica da vaidade, preconceito de cor.
b) sensualismo, crítica da presunção, elogio da mestiçagem.
c) presunção de superioridade, elogio da nobreza local, sátira da mestiçagem.
d) sensualismo, crítica da nobreza antiga, preconceito de cor.
e) estilo tropical, crítica da vaidade, elogio da mestiçagem.
3 - (Fuvest)
"Porque não merecia o que lograva,
Deixei, como ignorante, o bem que tinha,
Vim sem considerar aonde vinha,
Deixei sem atender o que deixava."
II."Se a flauta mal cadente
Entoa agora o verso harmonioso,
Sabei, me comunica este saudoso
Influxo a dor veemente;
Não o gênio suave,
Que ouviste já no acento agudo e grave."
III."Da delirante embriaguez de bardo
Sonhos em que afoguei o ardor da vida,
Ardente orvalho de febris pranteios,
Que lucro à alma descrida?"
Cada estrofe, a seu modo, trabalha o tema de um bem, de um amor almejado e passado ou perdido. Avaliando atentamente os recursos poéticos utilizados em cada uma delas podemos dizer que os movimentos literários a que pertencem I, II e III são respectivamente:
a) barroco - arcadismo - romantismo.
b) barroco - romantismo - parnasianismo.
c) romantismo - parnasianismo - simbolismo.
d) romantismo - simbolismo - modernismo.
e) parnasianismo - simbolismo - modernismo.
Deixei, como ignorante, o bem que tinha,
Vim sem considerar aonde vinha,
Deixei sem atender o que deixava."
II."Se a flauta mal cadente
Entoa agora o verso harmonioso,
Sabei, me comunica este saudoso
Influxo a dor veemente;
Não o gênio suave,
Que ouviste já no acento agudo e grave."
III."Da delirante embriaguez de bardo
Sonhos em que afoguei o ardor da vida,
Ardente orvalho de febris pranteios,
Que lucro à alma descrida?"
Cada estrofe, a seu modo, trabalha o tema de um bem, de um amor almejado e passado ou perdido. Avaliando atentamente os recursos poéticos utilizados em cada uma delas podemos dizer que os movimentos literários a que pertencem I, II e III são respectivamente:
a) barroco - arcadismo - romantismo.
b) barroco - romantismo - parnasianismo.
c) romantismo - parnasianismo - simbolismo.
d) romantismo - simbolismo - modernismo.
e) parnasianismo - simbolismo - modernismo.
4 - (Fuvest) A poesia lírica de Gregório de Matos subdivide-se em amorosa e religiosa.
a) Quais são os dois modos contrastantes de ver a mulher, em sua lírica amorosa?
b) Como aparece em sua lírica religiosa a idéia de Deus e do pecado?
5 - (Fuvest) Dê
argumentos que permitam considerar o Padre Antônio Vieira como um
expoente tanto da Literatura Portuguesa quanto da Literatura Brasileira.